segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Substituído

Deixar seu país de origem é saber que lentamente sua presença não será mais requerida ou notada, ou pelo menos não do modo que se espera. Que o espaço uma vez ocupado por você nunca será preenchido da mesma forma, mas abre caminho para outros tomarem conta.
É algo natural e ocorre!
Lembro muito de um blog que eu lia, infelizmente encerrado e coincidentemente sobre Israel, onde a autora dizia de forma direta sobre isso, que era para não prestarmos a atenção nisso e seguir em frente. Certa ela estava, mas a vida humana não é vivida de forma que o desapego seja simples.
São desde encontros de amigos, reuniões de família, passando por outros tantos momentos e eventos dos quais você imigrante não estará presente.
Quando eu sai do Brasil eu dizia para muita gente, entre familia, amigos e namorado, que a dor da despedida era muito maior em mim, pois era eu quem estava prestes a entrar num mundo novo, desde a língua, sociedade, trabalho, longe de todos, sozinho. Que para os demais seria menos dolorido, pois eles continuariam em seus meios sociais, com outros contatos, sem grandes surpresas. A minha ausência seria apenas uma no meio de tantas presenças, e para mim seria todas as ausências, e apenas a minha auto presença. Não se trata de uma disputa para ver quem sofre mais, o fato é que quem decide sair pagará um preço mais elevado pela sua escolha, pois para toda escolha há uma renúncia.
Não há um momento certo em que isto ocorra ou que se perceba, apenas é gradual e segue o fluxo da vida.
Eu não quero usar este espaço para fins religiosos, mas um dos preceitos judaicos que me veio a cabeça quando comecei a pensar nisso foi justamente do luto. É dado um tempo para o enlutado se manter distante, recluso, auto centrado, para justamente após poder retormar suas atividades da melhor maneira possível, a fim de seguir o fluxo da vida, que não para.
Não sinto que "morri" para as pessoas, talvez a comparação tenha sido forte, mas a intenção foi de se fazer perceber que a vida segue, e que se eu ou quem quer que seja decidiu dar uma guinada forte, tem que estar pronto para esta "consequência".
Saber desapegar é que complica um pouco, pois no meu caso, estou falando de 37 anos de vida numa sociedade, 12 anos de vida numa relação, e tanto outro tempo de contato com amigos dos mais diversos, e tudo simplesmente sofreu uma ruptura. Ao menos na presença.
Por outro lado, outras conexões aqui são feitas, algumas extremamente decepcionantes, e outras lhe dão um apoio moral e espiritual por vezes acima do esperado. Não sei se ocorre com todos, mas desde que cheguei aqui, recebi diversos flertes vindos do Brasil e de outras partes, na maioria das vezes de brasileiros. Alguns mais diretos, outros mais românticos, outros mais misteriosos, e eu demonstrei certo interesse num flerte, embora tenha terminado onde começou com passagem por outro continente, outro cheio de promessas não cumpridas, outro eu quase tomei um voo para um encontro.
Certas amizades que eram insípidas se tornaram muito próximas, outras que eram iniciantes se tornaram quase confidentes.
De todo o modo, não dá para generalizar que tudo que descrevi ocorrerá com quem sair do país, e será nesta ordem. O que é necessario mesmo é se concentrar no que se está ganhando, nas novas vivências adquiridas, no fortalecimento que uma vida fora do seu país exige, e perceber que se está cercado de pessoas que lhe admiram e que lhe fazerm muito bem, que lhe ajudam de maneiras impensáveis e quando menos se espera. É portanto, não se concentrar nas perdas, e sim nos ganhos, pois este foi o motivo primordial da mudança, e por vezes entender que o passado não é um fantasma, e sim como uma estante, com suas medalhas, troféus e todo o motivo de orgulho, pois onde quer que você chegue, o seu passado lhe trouxe para seu presente e lhe convida a desenhar seu futuro. Transformar, portanto, seu luto em luta*, e dela ver brotar as conquistas. Apenas se dê o tempo necessário para isto.
Pessoas queridas e amadas que muito me fazem falta.
* In Portuguese, L U T O means grief, and L U T A means fight. Probably, the translation couldn`t show you they are very close words, with so different meaning.

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