sexta-feira, 26 de abril de 2019

2 anos longe de muitos, mais perto de mim.

Já pararam para pensar que a vida de uma pessoa é como um livro, escrito em tempo real? Felizmente, ou não, jamais teremos acesso a totalidade do que cada um vive.
A sensação de ter completado estes dois anos em Israel é esta, da escrita do meu livro pessoal, de um modo mais intenso. O ponto chave é a experiência que se ganha em viver fora do seu país de origem e as transformações que lhe ocorrem.
Pode parecer chavão, mas definitivamente não sou mais a mesma pessoa que deixou o Brasil dia 25 de abril de 2017 no voo da Turkish Airlines. Há coisas que não mudam, e outras demoram para mudar.
Jerusalém sob frio e chuva não foi fácil, mas ainda assim linda
Lembro como se fosse a poucos instantes a minha última ligação, feita na fila de embarque da aeronave. Eu estava me sentindo sufocado, me questionando: "O que eu estou fazendo da minha vida?", eu perguntei.
É difícil definir que foi a melhor coisa que fiz, mas certamente foi uma boa opção.
Quem me conhece sabe o quanto eu me entrego e o quanto me dedico aos outros quando precisam, mas sem que eu notasse, eu estava apoiando os demais, muitos por perto avançavam, e eu parado no tempo e no espaço. Não posso reclamar, de um modo em geral, da vida que levava. De alguma forma eu era amado, eu tinha um bom emprego e sinto muita saudade de todos na escola, tenho uma boa família, mas esta sensação de comodidade, de estar para trás, preso em mim mesmo estava me incomodando há tempos.
E de repente, eu me sinto triste, sem motivos aparentes, noutros é uma felicidade sem tamanho. Noutros momentos me vejo falando outras línguas com brasileiros, como um proto espanhol, inglês e hebraico - e isto quando não há motivos para falar outra língua além do português. No dia anterior que escrevi esta publicação, tive claros sonhos em inglês e hebraico. Já me atrapalhei ao encontrar alguém falando português comigo. Ou seja, uma confusão de sentimentos.
Há, claro, frustrações ao imigrar. Conexões que pareciam inabaladas simplesmente deixam de existir, pessoas que parecem querer apenas ocupar um espaço no passado, e não no presente, como se a distância física fosse uma desculpa. Outras que diziam querer fazer parte do seu cotidiano e simplesmente sumiram. Quando parece que estou firme no meu trabalho ou algo do cotidiano, aparentemente do nada as coisas mudam e tenho que aprender a me adaptar, a seguir em frente. Por vezes sinto que estou indo bem, e não é o mesmo que sentem, e o oposto obviamente também é verdadeiro.
Contudo, há também o ganho de novas conexões. E de repente, muitas das minhas leituras que diziam que israelense, em geral é ranzinza, vão cada vez mais se provando falsas. Há muita gente grosseira, é verdade, mas quando se encontra a doçura no comportamento, saiba que é verdadeiro, e é doce como mel, e por isso mesmo, deve ser valorizado, reconhecido, e incentivado.
As dificuldades naturais da vida, quando você está longe da sua origem, são ampliadas de forma particularmente grande. Recentemente acabei indo trabalhar numa empresa que descobri ser fraudulenta, e sofri com as consequências disto, pois meu salário veio errado num mês, e no seguinte, após eu me demitir, simplesmente não recebi nada, portanto, fui obrigado a lutar com o que fosse possível para manter minhas contas pagas.
De todo modo, entre o bem e o mal, sinto que tudo isto me fortalece e não me arrependo da mudança a qual eu mergulhei, e ainda estou no mergulho. Do mesma forma que falei aos meus pais quando eles me visitaram ano passado, eu repito aqui: o que tenho conseguido, o que sinto que posso ganhar me estimula a continuar. Eu olho para trás, para tudo o que passei e sinto orgulho de mim mesmo. Talvez as escolhas não tenham sido as melhores, mas foram aquelas que tinham que ser feitas.
Percebi que evitar excessos de contatos com brasileiros, como era um motivo inicial para evitar atrapalhar no desenvolvimento do hebraico, se tornou um isolamento. Felizmente este erro foi corrigido. Vivo com brasileiros, conheci pessoas maravilhosas, e vivo com elas. É uma rede de ajuda mútua e que vale a pena ser preservada e reconhecida, e a cada novo contato, novas histórias que me inspiram e fascinam.
De alguma forma que não consigo explicar, me rodeei de pessoas boas. Desde o inícios da minha chegada, percebi que haviam pessoas que sugavam a minha energia, e soube impor uma distância de segurança, e me aproximar ou deixar que se aproximassem pessoas de bom caráter, boas vibrações, que permitem uma saudável relação de troca de idéias, de interesse por suas angustias, alegrias e esperanças.
Eu e minha fotografia exposta.
Com todas as dificuldades e saudade de tudo e todos, ainda assim eu sinto que tenho muito mais a ganhar, a receber, e dar em troca também. Em agosto de 2018 eu participei de uma exposição fotográfica, eu ainda recebo ajuda financeira para estudos, aluguel, Impostos. Em breve terei uma audiência no Ministério da Absorção e Integração para captação de fundos para minha carreira. Em nenhum momento eu tive qualquer tipo de incentivo deste gênero, e jamais terei palavras apropriadas para agradecer tamanha generosidade e carinho que recebo por meios turvos, confusos.
Há momentos que me sinto como uma criança pequena, querendo que alguém simplesmente me pegue pelos braços e resolva o que me aflige, mas ao invés disto, é como seu eu recebesse um puxão de orelhas e mostrassem o caminho, e eu tenho que seguir, e sigo.
Esta foto representa minha mudança do Sul para Tel Aviv
Noutros momentos dá uma angústia por querer me expressar e estar muito longe da minha língua nativa e não saber faze lo, mesmo em inglês, língua esta que eu falo em alto nível. 
Imigrar, portanto, é também um exercício de paciência, de resiliência e de auto conhecimento.
E como quase tudo nessa vida, acompanhado é sempre melhor, e por isto os retratos daqueles que em muito me ajudaram neste ano que se passou, e que os levo com carinho daqui por diante, cada um a sua maneira, cada um por seus motivos.
No fundo, o que percebo, é que eu gostaria mesmo que cada um pudesse ser livre para ir e vir para onde considera melhor para si, assim como eu pude. Como eu não posso alterar algo acima das minhas possibilidades, o que faço e me sentir agradecido por tudo que recebo, pelos amigos que fiz, pela oportunidade que eu ganhei e faço questão de trata la como um presente novo, afinal, são os primeiros 2 anos de muitos que virão. Sou, como poucos, um privilegiado!
Como disse uma sabia professora, não posso mais me concentrar no que pedi, e sim no que vem pela frente. Quem saiu do meu caminho o fez por que quis, então me cabe continuar. Se quiser me companhar, até posso jogar uma corda, mas terá que correr pois a diante, e não tenho mais como voltar.

2 anos longe de muitos, mais perto de mim.

Já pararam para pensar que a vida de uma pessoa é como um livro, escrito em tempo real? Felizmente, ou não, jamais teremos acesso a totali...